corra ou ame.

é em noites infinitas como essa,
nas quais você decide abraçar
(em melancolia sem fim)
que você pode finalmente olhar no espelho
e defronte teus pálidos olhos azuis,
você se reconhece.

em sorriso profundo encontra:
um grande e original amigo, namorado e paixão.

é talvez aqui e assim,
– trivialmente
onde esses ciclos intermináveis que lhe acompanham
finalmente cessam marcha.

jamais se pôde amar correndo.

amigo.

estávamos deitados
lado a lado
falávamos sobre recentes dores amorosas
e sobre vida.

você me disse que
queria um amigo assim,
e então, sem planejamentos
nos presenteamos um ao outro.

um amigo, chamaríamos.
hoje meu reflexo te contém
e já me sinto mais seguro aqui sozinho nessa sala,
sei que você sempre está aqui também.

de outro mundo,
de uma ordem inesperada,
damos sorrisos e parecemos nos comportar bem
com essa coisa de
iniciar e não acabar.

vazios.

as pessoas possuem um instinto para conexão, e constante e pós-moderna ação guiada a desconexão.
minha mãe, em suas frequentes crises, eventualmente caía em um abismo existencial e me falava, soluçando enquanto chorava: “que saudades de minha mãe, eu queria o colo dela agora”.
você vê, minha mãe não tem mais colo, quiça nunca o teve de verdade. nunca soube se conectar de forma satisfatória, mas sempre tentou. suas tentativas sempre faíscaram e pegaram fogo – não é tão fácil se apaixonarem pela fera como é pela bela, diferente do que lhes disseram nos filmes.
queimadura é um tipo peculiar de machucado que dói, deixa marcas e até mesmo preconceitos. qualquer criança que se queima no fogão passa a ser menos curioso com ele.
minha mãe eventualmente deixou de ser curiosa com o mundo.
eu não posso senão ser empático e derramar algumas lágrimas ao lembrar de suas crises e quão abraçado estou com elas em meus vazios.

ninguém.

ela me disse que não sabia se tinha muito a oferecer.
nada tens. o que tanto quero?
me confortei ao pensar o quão desesperador era essa declaração,
talvez apenas uma vulnerabilidade forjada.

mas os dias passaram,
e você não veio.
as vezes penso que nem eu vim,
fiquei por algum não-lugar.

em dias escuros de ouvidos muito abertos,
de fato:
nada tenho a oferecer
e me parece que todo mundo já sabia.

mortem.

algumas coisas estão tão enraizadas que
você poderia ser morto pelo hábito e nenhuma fibra de seu corpo ficaria surpresa.

há momentos de silêncio
que um homem precisa para viver.
é como um grande suspiro que separa o nada do tudo.

em meu ninho, foi naturalizado que se isole sem grandes notificações,
“é a vida”.
isole-se, não como um lobo saúdavel e solitário,
mas em sinais claros de sofrimento que escritos em nossa pele sussuram:
– cure-se, e tente gritar sem sucesso.

ele.

Da janela de meu quarto avistei:
no topo de uma montanha gloriosa
e de longe vislumbro dEle.
minhas entranhas sabiam: era deus!

me atropelei às pressas em fome de conhecer.
me machuquei dez mil vezes
e outras dez mil sorri, amei e desamei.
aprendi e desaprendi.

já com meus joelhos cansados,
vi Tua sombra: doce engano.

olho para cima,
era eu mesmo o tempo inteiro.

me encontrei.

súplica.

não está em meu alcance
ser nem metade do que me aspiram a ser.
eu não sou apenas eu,
mas todos vocês.
formamos um nós,
e agora encurralado em
extrapolações dos absurdos,
finalizamos-nos com as palavras.
na impossibilidade da expressão coesa e verbal
nos ataco em músicas e poesias para viver os sentimentos proibidos
em vossas narrativas.

quero paz.
não me deixem em paz.
transcedemos todos juntos.
faço a súplica e vocês,
o protesto.

talvez um dia.
por hora, sobrevivo tendo-me.

entre casulos e borboletas

nós não sabemos como sentir felicidade.
esquisita, quando chega toma formas mais comuns,
como ansiedade ou um choro tímido.

já não sabemos nem entristecer,
já que é proibido e deve ser compartilhado apenas
com objetos inanimados de um quarto qualquer.

finalmente, não sabemos nada de nosso íntimo,
desde que as paredes com o mundo a fora foi incentivada
e dominamos nosso patrimonio agora tão interno.

no mais, nos afundamos em preciosidades fechadas
com medo de tudo que é aberto.

o casulo é uma grande e passegeira prisão para uma borboleta
voar.

#

estou amaldiçoado,
pelos outros.

passaram-se os anos
e me enchi de flores
bem afiadas
e toda vez que as alcanço,
me lanço em espinhos raivosos.

agora sangro, e sem culpa.
esvazio pratos solenemente para passar o tempo.
a ciranda que vocês, meus, fazem ao redor de meu corpo
é bela e estéril, frustrada em si mesma.

juntos, produzimos epifenômenos declarados aqui como
paredes maciças de um corredor escuro onde o fim nunca é tocado por minhas
imprecisas mãos.
o momento é difícil de engolir.

sigo nestes versos prematuros, como tentativa de transtemporalizar estes minutos: